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Disparo manual desnecessário do sistema de combate a incêndio em submarino atômico russo “Nerpa” – classe Akula – causa 20 mortes e vários feridos – 08.11.2008

O submarino atômico russo Nerpa, em construção há uns cinco anos chegou ao inicio de novembro à fase de testes de comissionamento. Naquele dia o submarino tinha 208 pessoas a bordo. Oitenta e um eram militares e o restante civis, muitos do estaleiro que construiu o submarino, não necessariamente treinados para os procedimentos corriqueiros em uma nave deste tipo. Os submarinos da classe Akula (tubarão em russo)- carregam normalmente uma equipe de 73 marujos.

No dia 8 de novembro chegaram as primeiras noticias do acidente ainda sem dados precisos, como mostra a reportagem da TV Russa, falada em inglês, abaixo. Este vídeo mostra algumas cenas do interior de um submarino da classe Akula e permite uma visão dos exíguos espaços e rotas de fuga entre as seções da nave:

Nesta altura se sabia das mortes (20), dos feridos (21 que foram evacuados do submarino, depois transladados para o barco de regate para posteriormente serem transportados para hospitais), do disparo que se pensava acidental do sistema de proteção de incêndio – as sindicâncias internas já haviam iniciado. É importante ressaltar que não foram registrados vazamentos no circuito de propulsão atômica do submarino.

De acordo com Igor Dygalo, porta-voz da Marinha Russa, este submarino ainda não fazia parte da frota e ainda estava sendo submetido a testes. O esquema abaixo mostra detalhes de onde ocorreu o sinistro:

corte-submarino-classe-akula

1.  Pessoas trabalhando na seção dianteira do submarino afetada quando o equipamento d extinção atuou de forma inesperada

2. A área afetada pode ter sido isolada, prendendo pessoas em seu interior. Havia uma equipe maior de funcionários do que usual a bordo do submarino que estava sendo submetido a testes.

3. O equipamento de extinção de incêndio libera gás de Freon que é sufocante.

4. Vinte pessoas morrem e 21 são feridas.

No dia seguinte outra notícia da TV russa dá mais detalhes, agora já se sabendo o resultado das autópsias: sufocamento por inalação de gás FREON 2402 usado como meio extintor no sistema de combate a incêndio inadvertidamente acionado. Via de regra os marujos treinados para operação em submarinos carregam equipamentos para respiração autônoma que permite algum tempo de sobrevivência, mas no caso do Nerpa a nave estava com excesso de passageiros e a maioria deles eram civis, que não portavam este tipo de equipamento, muito menos tinham o treinamento dos militares. Especialistas estimam ser este um dos motivos da alta quantidade de óbitos no acidente registrado.

Eis o segundo vídeo desta matéria:

A atuação do Freon 2402 (ou Freon 142B, também Dibromotetraflouretano) de acordo com a “folha de risco” correspondente é a seguinte:

Vista geral do grau de emergência:

Líquido e gás sob a pressão.

Pode causar o sufocamento rápido.

Pode causar laceração por congelamento.

Rotas de entrada:

Inalação

Efeitos agudos:

Este material pode interferir com a capacidade do coração de acelerar quando a adrenalina é segregada em resposta ao esforço da raiva. O coração pode vibrar e parar em vez de acelerar. Irritação aos olhos, às membranas mucosas, e ao trato respiratório superior. O contato com a pele pode causar a irritação. A queda de pressão através das válvulas e o encanamento podem causarfrio e a congelamento extremos no contato.

Podemos ressaltar alguns pontos de precaução previstos em norma:

Instrução especial no combate a incêndio e Equipamentos: Aconselha-se o uso de equipamento autônomo de respiração e de roupa protetora integral. Mantenha os cilindros expostos ao fogo resfriados com água nebulizada.

Produtos perigosos decorrentes da combustão: monóxido de carbono tóxico pode ser desprendido durante a combustão.

Perigos raros decorrentes do fogo ou de explosões: A ruptura do cilindro pode ocorrer sob condições do fogo. Emitem-se emanações tóxicas sob condições do fogo.

Voltando aos acontecimentos e passado mais um dia ficou claro que o disparo do equipamento de combate a incêndio foi provocado por um erro de operação de um marinheiro experiente e os motivos que o levaram a acionar o equipamento ainda estão sendo investigados.

Veja o último vídeo da série desta matéria:

De acordo com Valdimir Markin do Comitê de Investigação do escritório da Promotoria Russa as investigações foram instruídas de acordo com o parágrafo 352 que se refere à “violação das regras de navegação” e estão envolvendo trabalhos para determinar o grau de responsabilidade das autoridades, tanto militares, como civis, no caso que levou aos óbitos.

Neste trágico acontecimento o Freon 2402 não foi usado realmente para apagar um incêndio, mas há críticas na própria Rússia quanto ao fato de se continuar usando este meio extintor, como reportado no Portal “RUSSIAN NAVY” que quanto a este acidente e ao uso do Freon diz o seguinte:

QUOTE

Na construção naval doméstica (russa), o uso de sistemas de combate a incêndio que usam de Freon como meio extintor tem seus partidários e oponentes. Por muitos anos houve uma luta pelo uso de métodos modernos de supressão de fogo a bordo dos submarinos. Houve uma conversa sobre sistemas especiais com nitrogênio. O nitrogênio inunda o compartimento que abaixa a concentração de oxigênio a 12 por cento e o fogo extingue. Neste caso mesmo pessoas que não conseguissem se conectar a uma máscara de emergência conectada a tubulação de ar de baixa pressão permaneceriam vivas e o equipamento no espaço circundante não sofreria.

As pessoas perguntaram-me: por que sistema de supressão automático de combate a incêndio a bordo continua a usar Freon?

Eu respondo: porque na Rússia, tem sempre sido assim. Constroem um barco super moderno, mas instalam um equipamento (de combate a incêndio) do século passado a bordo.

E assim vai…

UNQUOTE

Nas diversas noticias que circularam pela imprensa foi falado que o Freon 2402 “captura o oxigênio” daí um dos motivos dos múltiplos óbitos, a questão fisiológica já foi tratada acima (sem esquecer do relatado pânico que se estabeleceu na área atingida). Mas a questão física pode ser rapidamente abordada abaixo, se bem que excluindo algumas e raras aplicações específicas, estes tipo de meio extintor praticamente não é usado fora do que um dia constituiu a “Cortina de Ferro” e tempos atrás na Itália para fins aeronáuticos.

De acordo com a quadragésima edição de 1977 do Fire Protection Handbook da NFPA (nas edições mais recentes este tipo de gás não é mais tratado) temos para o Freon 2402 o seguinte modo de atuação:

-O mecanismo de extinção dos agentes halogenados não é claramente compreendido. No entanto, não há dúvida alguma que ocorre uma reação química visto que estes agentes são indubitavelmente mais eficazes que a retirada de calor ou o abafamento.

Os agentes químicos são muito mais eficazes devido a sua habilidade de interferir com os processos de combustão. Eles agem através da remoção dos agentes químicos envolvidos em reações em cadeia de chama (um processo conhecido como “quebra de cadeia”). Enquanto todos os halogênios são ativos neste processo, o bromo é muito mais eficaz que o cloro ou o flúor.

O mecanismo pelo qual o bromo inibe a combustão também não é totalmente compreendido, nem o são os processos de combustão em si. Mas os resultados práticos falam por si.

 

Fica então claro que a ação do Freon 2402 ocorre a nível de reação química da combustão do fogo e não na “captura de oxigênio” como propalado, mesmo porque as concentrações empregadas são dosadas em função dos ambientes a serem protegidos.

Nota do conselho editorial do Site Risco:

Hoje em dia, com o reconhecimento dos impactos ambientais que o Freon provoca o seu uso foi banido em muitos países, restando um uso destes componentes como meios extintores em pouquíssimas aplicações para as quais ainda estão sendo desenvolvidos sucedâneos ambientalmente mais coerentes com as preocupações modernas.

Como informação adicional podemos citar a sitação do meio extintor ainda usado na Rússia quando a questão do ODP – Ozone Depletion Potential. Vamos comparar com o conhecido “gás de geladeira” CFC cujo ODP é 1 e o Freon (ou Halon) 2402 tem ODP=6 o que mostra o quanto ele é nocivo à natureza.

No Brazil estes gases são banidos assim como os:

Halon 1211 ODP=4 que era usado em extintores

Halon 1301 ODP=10 usado em sistema fixos de combate a incêndio.


[Vídeo originalmente armazenado no Google Vídeo (desativado) restabelecido com cópia do Youtube em 09.05.2013]

novembro 25, 2008 at 12:37 pm 2 comentários


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